"Merci Patrick, Merci pour tout"...
Assim a conceituada revista especializada francesa Auto Hebdo começa sua matéria do Grande Prêmio da Alemanha. E continua:
"Obrigado por defender a honra de nossos amigos Gilles Villeneuve e Didier Pironi. Obrigado por garantir o prestígio e a confiabilidade da Equipe Ferrari. Obrigado por nos provar que a osmose existe"
Também na França, Gilles Villeneuve era ídolo, independente de sua ascendência e da língua que falava. Sua morte acabou permitindo que um francês Didier Pironi, marchasse para uma conquista inédita para um automobilismo de tantas glórias: o Campeonato Mundial de Fórmula 1, a coroa de melhor piloto do mundo, um feito que até hoje nenhum francês logrou obter.
Por isso mesmo, o catastrófico acidente de Pironi nos treinos de classificação para o Grande Prêmio da Alemanha marcou tão profundamente.
Ele aconteceu no melhor momento de Pironi, no melhor momento da equipe Ferrari e, com toda certeza, no auge da compulsão emocional de um público aficionado, que jamais extrapolou seu júbilo com grandes manifestações, como acontece, por exemplo com os italianos e argentinos.
Foi demais. Em menos de três meses os franceses perderam seu grande ídolo, o franco-canadense Gilles Villeneuve e viu ameaçadas as chances de uma vitória no Campeonato Mundial de Pilotos.
E pior, dificilmente Didier Pironi, sem dúvida o melhor piloto da França, voltará às pistas.
Para que se possa medir a extensão desta tragédia basta lembrar que o Brasil, sem qualquer infra-estrutura ou tradição no automobilismo, já conseguiu produzir material humano capaz de arrebatar três campeonatos mundiais e três vices nos últimos dez anos. E os franceses sequer um campeonato em mais de 50 anos de ativa participação.
Nelson Piquet
Diante deste quadro, é compreensível porque havia no ar tamanha emoção quando Patrick Tambay recebeu a bandeira quadriculada. Era sua primeira vitória na Fórmula 1 e ele a conquistou com muita verve.
Ultrapassou os dois Renault, assumiu a dianteira quando Nélson Piquet teve que abandonar, depois de um ridículo "entrevero" com Eliseo Salazar, e soube manter sua posição de liderança com visível tranqüilidade.
Mais importante, ele correu sob intensa pressão. Não de qualquer outro piloto, mas sob pressão de sua próprias responsabilidades. Depois que Didier Pironi dominou totalmente os treinos classificatórios ficou provado que o carro do momento se chama Ferrari. Então, toda a equipe só poderia apostar em Tambay. Além disso, os franceses acreditavam nele.
Seria muita coisa para um eterno segundo piloto de grandes equipes, para alguém que foi praticamente expurgado da categoria pela McLaren e só retornou, esporadicamente, para ocupar lugares vagos por titulares acidentados, exatamente como aconteceu na Ferrari.
Final dos treinos, a pole position pertencia a Didier Pironi que, naquele instante, jazia inconsciente em um hospital.
Na hora da largada, incrivelmente emocionante, seu lugar ficou vago no grid, com Prost, Arnoux, Piquet, Tambay, Patrese, Alboreto, De Cesaris, Rosberg e Watson, os outros nove mais rápidos, ocupando suas posições de direito.
Renê Arnoux pulou na dianteira mas já na segunda volta a posição de liderança era de Nelson Piquet. Assim, a primeira parte da prova pertenceu inteiramente ao campeão mundial que levou seu Brabham-BMW a uma liderança maciça, ainda mais tranqüila de se obter quando se sabia, de antemão, que seguindo o novo esquema da equipe, seu carro largara com pneus de classificação e somente metade da capacidade total do tanque de combustível.
Nos treinos, um atento espectador: Ayrton Senna, vencedor na preliminar
E assim foi. Só que, mais uma vez, a sorte não estava ao lado de Piquet.
O previsto era entra nos boxes na volta 23, reabastecer e trocar os pneus e, ainda assim, voltar na liderança. Tamanha era sua vantagem sobre o então segundo colocado, Patrick Tambay, que ninguém duvidava que a tática iria dar certo.
Entretanto, ninguem contava com a brilhante manobra de Eliseo Salazar, na volta 18.
Na freada da gincana, o chileno abriu espaço para ser superado, pela segunda vez, nas 18 voltas. Foi ultrapassado normalmente mas, por razões que nem ele conseguiu explicar, voltou a acelerar para disputar a freada com Piquet que, bem dentro do desempenho dos carros turbocomprimidos, completava o raio de curva em velocidade inferior à dos motores aspirados.
E não deu outra. Piquet contornava a curva quando, rodas bloqueadas, em supremo exercício de inabilidade ou grossura, em português correto, o ATS de Salazar abalroou o Brabham. Enfim, os dois fora da corrida ...
Então, acabou acontecendo. Nelson Piquet pulou fora do cockpit em estado de total alucinação e caiu de murro em cima do chileno.
Na nossa opinião, diante de tamanha aberração, Piquet bateu até pouco...
Só que, na mesma medida, os europeus, sempre tão finos e cheios de melindres, não o perdoaram.
Enquanto a Equipe ATS prometia expulsar Salazar de sua fileiras, claro, no ano que vem, só depois de tomar do chileno até o seu último tostão, a imprensa inglesa criticava violentamente a falta de fleuma do brasileiro.
Memória curta porque, pelo menos para nós, ainda existe a forte lembrança de atitudes ainda mais vulgares por parte do inglês James Hunt.
Arnoux lidera seguido por Tambay
Depois disso, ficou muito fácil para Patrick Tambay. Após ultrapassar os dois Renault no início da prova, o panorama então era o seguinte: Prost já havia abandonado e Arnoux não tinha equipamento para tentar qualquer reação.
Mesmo assim, terminou em segundo, seguido por Rosberg, com seu carro falhando bastante, Alboretto, Giacomelli com sua saias destruídas e Marc Surer, surpreendente no pouco competitivo Arrows.
A oito voltas do final, John Watson perdeu uma certeira terceira posição e, mais importante, mais quatro pontos no campeonato ao abandonar com a suspensão quebrada.
Foi um bom desempenho do veterano piloto que representou sozinho a equipe McLaren depois que Niki Lauda fraturou o pulso nos treinos.
Como em Paul Ricard, Hockenheim necessitava de turbocompressores para ser competitiva. E, à exceção da equipe Toleman, os turbos eram pelo menos, em média, três segundos mais rápidos que os melhores carros aspirados.
Assim, como era de se esperar, Hockenheim deixou pelo menos uma evidência: com uma chicana ainda mais estreita e lenta e uma curva acentuada (Ostkurve) como novidades, a pole de Didier Pironi foi somente dois segundos mais lenta que a melhor marca desta pista, obtida por Alan Jones, ainda na era das minissaias.
Com carros cada vez mais rápidos, os circuitos ficam cada vez mais lentos ...
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