quinta-feira, 4 de setembro de 2014

QUATRO HORAS DE VELOCIDADE


Carretera Chevrolet Corvette

A prova Quatro Horas de Velocidade, disputada em Curitiba, em duas etapas (de duas horas cada uma), mostrou que o automobilismo brasileiro está evoluindo, não em organização, mas na construção e apresentação de bons carros de corrida.

Em Curitiba quem pagou o preço mais duro pela falta de segurança do autódromo e de organização foi o próprio dono do autódromo, Flávio Chagas Lima. Durante os treinos de sábado, véspera da corrida, êle estava junto à pista, orientando o trabalho de quatro operários; quando o Fúria FNM, pilotado por Jaime Silva, na curva que antecede a reta dos boxes se descontrolou, saindo da pista e atropelando Flávio, que foi hospitalizado com fratura exposta na perna direita. Parte da suspensão e a traseira da carroçaria do Fúria foi arrancada no acidente e o carro não pôde participar da prova do dia seguinte.

A segunda etapa das Quatro Horas de Velocidade valeu para o Campeonato Brasileiro de Automobilismo. Foi reservada a carros da categoria 5 e 6, além dos da categoria 3, enquadrados na 5. O resultado foi óbvio: venceu o melhor carro, um Porsche 910, de 2.000 cilindradas, apesar de mal pilotado por Mário Olivetti, de Petrópolis. A superioridade do Porsche sôbre os demais carros era tão grande que só por culpa do pilôto êle poderia perder. E teria perdido se alguns de seus adversários não tivessem quebrado.

Norman Casari no protótipo Ford -Casari

Quem deu o melhor espetáculo foi José Renato Catapani, o "Tite Flecha", com sua Alfa Romeo GTA de 1.600cc. Apesar de ser ainda um novato em corridas e de estar correndo com um carro inferior, conseguiu aos poucos superar numerosos competidores e chegar em segundo lugar.

Vários carros com possibilidade de vitória alinharam para largada. Além do Porsche 910, estava a velha carretera Chevrolet Corvette de Camillo Christófaro, o BMW 2002 spyder de Jan Balder, o protótipo Ford-Casari de Normam Casari, o protótipo Ford que aproveita tôda a mecânica de um Fórmula Ford-Merlyn de Renato Peixoto, o Opala 4100 de Pedro Victor De Lamare, o Puma de Freddy Giorgi e o Snob's Corvair de Eduardo Celedônio. Haviam ainda as Alfa Romeo GTA de Catapani 1600cc e de Leonardo Campana Júnior 1900cc.



Alfa Romeo GTA 1600 de Tite Catapani

O Porsche 910 que havia marcado o melhor tempo nas provas de classificação, saiu na frente, mas logo foi ultrapassado pela carretera de Camillo, que soube aproveitar todos os 400 HP de seu motor. Mas, na segunda volta, Olivetti conseguiu recuperar a liderança. Camillo insistiu e, duas voltas depois, voltou a ultrapassar o Porsche 910.

Dava a impressão de que, após uma longa série de insucessos, Camillo e sua carretera voltariam a se encontrar com a vitória. Mas a sorte fugiu-lhe outra vez: na sétima volta, um pistão quebrou, obrigando o pilôto a desistir da corrida. Mas enquanto estêve na pista, ela ofereceu ao público a briga mais bonita da prova: um carro velho, com um tipo de suspensão já superado, levando a melhor sôbre um moderno Porsche 910.

Com Camillo fora da prova, Olivetti sossegou um pouco na liderança. Sua única preocupação passou a ser Norman Casari, que com o protótipo Casari-Ford, construído por êle mesmo, fazia uma excelente corrida. Embora seu motor rateasse um pouco, aos poucos o Casari-Ford reduzia a diferença que o separava do líder. Em seguida vinha um grupo compacto formado pelo spyder BMW, pelo Opala de De Lamare e pelas duas Alfa Romeo.  


O DKW-Volkswagen com dois motores

Se nenhuma das etapas da prova Quatro Horas de Velocidade chegou a oferecer grandes emoções, pelo menos uma delas, exatamente a mais importante, provocou muitos risos entre os espectadores: entre os possantes GT que alinharam para a largada, havia um carro engraçadíssimo que, embora tivesse sido enquadrado na Divisão 5 da Confederação Brasileira de Automobilismo, pela lógica não caberia em divisão alguma. Tinha aparência de um monoposto, com as rodas descobertas, embora tivesse lugar para duas pessoas.

Estranha mesmo era sua mecânica: dois motores, um DKW na frente e um VW atrás. E também dois câmbios, duas alavancas, dois aceleradores. Só o freio e a embreagem tinham, cada um, um pedal.

O carro foi construído na cidade de Cascavel, por Deuclides Carperredo. E foi pilotado por Pedro Mufato. Tem tração nas quatro rodas, dianteira pelo sistema DKW, inclusive com suspensão original e freios a disco. A traseira é VW também com suspensão original.

Para alimentar êsses motores, de concepção diferente, o DKW de dois tempos, refrigerado a água, três cilindros em linha; e o VW , com quatro cilindros contrapostos e refrigerado a ar, o carro tem dois tanques de combustível. Um de 60 litros para o VW, e outro de 40 litros para o DKW.

"Dirigir êsse carro não é difícil", assegura seu pilôto, "é só questão de hábito". As duas alavancas de câmbio são acionadas simultâneamente, mas o motor VW serve para por o carro em movimento, com a primeira e segunda marchas, enquanto o DKW, por ter uma relação de câmbio mais longa, é usado só nas altas velocidades.

O carro conseguiu correr até o final da prova, chegando em décimo lugar, depois de atrapalhar bastante os mais velozes.

PORSCHE 910

Pela primeira vez, os melhores carros não eram os de São Paulo, e sim os do Rio. O Porsche 910, que apesar de mal pilotado, é um dos mais rápidos existente no Brasil, o Protótipo Casari-Ford e o Protótipo Ford-Merlyn.

O Porsche 910 de Mario Olivetti, é um protótipo môdelo 1967 derivado do môdelo Carrera 6. Nesse ano, o 910 foi o carro oficial da Equipe Porsche.

Casari obrigado a parar nos boxes com problemas nos freios e no sistema de refrigeração do motor, resolveu desistir. Jan Balder também também parou, com o suporte do diferencial quebrado. Pedro Victor passou para segundo, seguido de perto pelas Alfa, que aproveitavam o vácuo de seu Opala.

Êsses três carros eram então os únicos que poderiam ameaçar a liderança do Porsche. Mas Pedrinho logo viria ser mais uma vítima da desorganização da prova; a pista estava cheia de pedregulhos, que se tornaram uma perigosa ameaça, sempre que dois carros se aproximavam e seus pneus funcionavam como catapultas. Uma pedra arrebentou o pára-brisas do Opala, que passou a perder 2 segundos por volta. As duas Alfa o ultrapassaram e êle terminou em quarto.  

Sgarbi: da vitória para a enfernaria

Carlos Alberto Sgarbi estava com o rosto coberto de sangue quando cruzou a linha de chegada, pilotando vitoriosamente o Opala 51 da Equipe Valvoline, na primeira etapa das Quatro horas de Velocidade.

Uma pedra atirada pelas rodas do carro do corredor paranaense Atair Barranco, quebrou o pára-brisas do Opala e feriu o rosto de Sgabi, que logo depois da corrida teve de receber três pontos no nariz.

Sem pára-brisas e com o rosto sangrando muito, Carlos Alberto Sgarbi não diminuiu o ritmo de sua corrida e continuou grudado na traseira de Altair Barranco. Altair acelerou demais e o motor de seu Opala estourou. Daí em diante, Sgarbi não teve qualquer dificuldade para continuar na frente, chegando ao final da corrida com quatro voltas de vantagem sôbre o segundo colocado, Angi Munhoz, de Piracicaba, com Volkswagen 1600 da equipe MM.

Angi não tinha condições para disputar a liderança, pois seu carro era inferior. Porém sempre esteve entre os da frente, superando inclusive carros mais potentes, como o Opala de Moacir Rosemberg, de Pôrto Alegre. Além do segundo lugar que obteve na prova, Angi foi o primeiro colocado na categoria até 1600cc. Sergio Withers, de Curitiba, foi outro que fêz uma boa corrida. Brigou muito com o Opala de Moacir e terminou em terceiro.

Um incidente curioso ocorreu quando Sgarbi voltava para São Paulo e o carro que rebocava o Opala de corrida começou a pifar. Êle decidiu então fazer o resto da viagem dirigindo o Opala, mas, antes de chegar a São Paulo, foi detido pela Polícia Rodoviária. O carro, disseram os policiais, sem pará-choques, com escapamento aberto e com o pára-brisas quebrado, não tinha condições de trafegar na estrada, por não "oferecer segurança". Mas terminaram por deixar que Sgarbi prosseguisse a viagem.