( Athens,Greece 18 October 1920 – 6 March 1994)
Tarde cinzenta, na sessão de cinema da minha casa, "STELLA", primeiro filme da extraordinária atriz e ativista Melina Mercouri ...
"No Weekly Film Bulletin de sexta passada – o semanário virtual da Sight and Sound com as novidades da semana, – tive uma bela surpresa. Toda semana a revista escolhe o que chama de This week classic cover, ou seja, uma capa histórica que vale resgatar. A dessa semana foi a de Stella, o longa de Michael Cacoyannis, de 1955. A edição da revista é a do Winter/Inverno daquele ano. O beijo de Melina Mercouri e Giorgos Fountas. A Carmem de Cacoyannis. Viajei naquela capa. Hoje em dia ninguém mais fala em Melina, nem em Cacoyannis. Ele, quando é lembrado, é por suas tragédias nos anos 1960 e 70 – Electra, As Troianas e Ifigênia -, ou então por Zorba, o Grego, que adaptou do romance de Nikos Kazantzakis, em 1965. Gosto muito do que diz Jean Tulard, no Dicionário de Cinema, sobre o último – “Anthony Quinn, no filme, terminou por se tornar mais grego do que os gregos.”
É ainda Tulard quem o define – o cineasta por excelência da Grécia. De origem cipriota, abordou os grandes temas da tragédia grega, os grandes temas políticos, como a divisão de Chipre. Paulo Francis acusava-o de, eventualmente, transigir com seus princípios estéticos ao aceitar a ingerência de capitais internacionais. Agredia-o a salada de sotaques no universo sombrio de As Troianas – Katharine Hepburn, norte-americana, Vanessa Redgrave, inglesa, Irene Papas, grega, Geneviève Bujold, canadense. Eu, que nunca fui tão purista, guardo a lembrança do lamento fúnebre de Hécuba, um grande momento da carreira de Katharine Hepburn. Mas Electra e Ifigênia são melhores. A máscara trágica e a beleza agreste de Irene Papas, a fotografia em preto e branco de Walter Lassaly, que ganhou o Oscar da categoria em 1964, por Zorba.
Nos anos 1950, o jovem Cacoyannis – estava nos seus 30 anos, nasceu em 1922 – irrompeu nas telas de todo o mundo com dois poderosos retratos de mulheres – Stella, a sua Carmem, magnificamente interpretada por Irene Papas, e A Mulher de Negro, com a não menos deslumbrante Ellie Lambert. Há um quê de neo-realismo na descrição dos bairros pobres de Atenas no primeiro e, no segundo, violência e sensualidade explodem na tela quando dois atenienses passam férias na ilha de pescadores de Hydra e se envolvem com a beleza local, e era Ellie.
Parece-me curioso que quase ninguém mais fale de Melina Mercouri. Ela virou atriz – e mulher – de Jules Dassin, com quem fez todos aqueles filmes, incluindo Nunca aos Domingos, pelo qual foi melhor atriz em Cannes, Profanação – baseado em Fedra – e Corações Desesperados, que eu não lembro se tinha roteiro de Marguerite Duras ou se era só a história adaptada dela. Melina combateu a ditadura dos coronéis. Com a redemocratização, voltou para a Grécia – estava asilada na França – e substituiu o cinema pela política. Foi eleita para o Parlamento Helênico e, em 1981 ou 82, tornou-se ministra da Cultura, a primeira mulher a ocupar o cargo, na Grécia. Mas não era unanimidade. Jean Tulard credita à sua influência, que chama de ‘desastrosa’, a decadência de Dassin."
Luiz Carlos Merten
Publicado em 24 de abril de 2023

