Alguns trechos de uma entrevista com o jovem Nelson Piquet no final de 1978, quando fez suas primeiras participações na Formula 1 e ainda corria na Formula 3.
"Vou correr na próxima temporada para aprender. Em 1980, quero ser um vencedor, e quem sabe um campeão. Vou lutar para isso."
*Apesar de haver muita pressão para que Bernie Ecclestone contratasse outros pilotos como Clay Regazzoni e Elio de Angelis, ele assinou com você. Por que acha que foi escolhido?
"Antes de tudo quero fazer um reparo. Os jornais noticiaram que o Lauda estava pressionando muito para que o Regazzoni fosse contratado. Isto é mentira porque o Lauda considera o Regazzoni maluco. Pra mim ele é uma "toupeira". Nunca olha no espelho e pode estar andando bem devagar que não muda a tangência, simplesmente esquecendo que tem mais gente na pista. Depois batem e ele diz: "Bateram em mim". Acho que o Bernie me escolheu por três motivos: meus resultados na Formula 3, meu desempenho com o Mclaren M23 nas provas que fiz e principalmente, por apoio da Parmalat, que tem interesses econômicos no Brasil."
*O Bernie é famoso por fazer contrato com pilotos, prendê-los e usá-los quando lhe interessa, não lhes dando chance nem de pilotar para outra equipe, a famosa "geladeira". Já fez isso com o John Watson, o Patrick Neve, o Larry Perkins e tentou com o Alex Dias Ribeiro. Isto não o amendronta?
"Nem um pouco. Ele veio conversar comigo depois do Grande Premio de Monza. Meu contrato seria igual ao do Lauda, sem primeiro ou segundo piloto e valeria por um ano em que eu tenho que correr em todas as provas. Há mais dois anos de opção, mas se ele não me quiser na equipe, posso assinar com qualquer outra."
*Esta história de carros iguais para você e para o Lauda é meio estranha. Como é que ele poderia aceitar ter as mesmas atenções de um novato recém saído da Formula 3?
"A verdade é que aceita. Como aceitou com o Watson. O Bernie quer é ganhar corridas. Comigo, com ele, ou com qualquer outro que pilote um Brabham."
*No Canadá como foi sua recepção na equipe?
" Com os "mecas" e o resto do pessoal, tudo bem. O Lauda já sabia que eu ia ser o segundo no ano que vem e foi amistoso na medida de um austríaco bi-campeão do mundo. Amigável, mas sem muito papo. O Watson, que não sabe para onde vai e foi cuspido da equipe, foi bastante frio. Mas eu fiquei na minha. O Watson saiu porque, apesar de rápido, perdeu muito da técnica e andou errando bastante."
*O comitê de segurança dos pilotos de Formula 1, a mesma que suspendeu o Patrese, anda preocupada com os novatos. Querem fazer uma carteira provisória e de quatro em quatro corridas, julgar se o piloto merece renovação, até graduá-los. Em que medida isto lhe afeta como novato?
"Acho justo eles preservarem a categoria. No caso do Patrese, ele realmente já vinha aprontando, principalmente nas largadas. Na Austria, na primeira largada, no molhado, ele cruzou a pista de lado a lado duas vezes, saindo pelo acostamento. Isto é perigosíssimo numa largada e basta ver o que aconteceu na Itália. Mas, existe um porém. Se os mais velhos reclamam, e acho que isto não é para manter uma "panelinha", acho também que falta consideração para com os novatos. Na Holanda, por exemplo, os que tinham pneus mais moles, davam cinco voltas devagar e mais duas no limite para marcar tempo. Quando vinham forte, reclamavam do tráfego. Mas nas voltas em que vinham devagar, mantinham o traçado para não sujar os pneus. Aí, atrapalhavam os novatos que de pneus duros, tentavam se classificar para a largada. O Ronnie Peterson "chiou" comigo na Holanda e eu falei que ele havia me atrapalhado andando devagar no traçado incorreto. Ele nem me deu resposta."
*Você não acredita em "panelinha", mas você entra no lugar do veterano Watson. O Stuck e o Regazzoni vão ser substituidos pelos Jan Lammers, campeão europeu de F-3 e o Danny Ongais. Você não acha que a chegada de muitos novatos com dinheiro não os incomoda?
"Acho que incomoda, mas eles também foram novatos e muitos deles com dinheiro de patrocinadores. Eles tem que aceitar as regras do jogo em que tomam parte. "panelinha" pode haver, mas não tão coesa. Eu sinto, no Emerson, um interesse sincero no meu sucesso e na continuidade do trabalho dele e do Wilsinho com novos pilotos brasileiros. Se houvesse esta panelinha, ele não me ajudaria."
*E a presença dele em um retrovisor naquela velocidade? Dá para asssustar?
"Não. Dá só para respeitar porque ele anda rápido e com o carro totalmente sob domínio mas, para mim, na próxima temporada, vai ser um adversário como os outros."
*A diferença do Brabham para o McLaren que você vinha guiando é muita?
"Não dá para acreditar. O limite é tão grande que, às vezes, tenho que me policiar, porque já o sinto na mão. Quando ele atravessa, pode até atingir um ângulo de 45 graus, que é só corrigir no acelerador. O Brabham é a coisa mais maravilhosa que se pode imaginar. Quando se calca o acelerador no fundo, a potência do motor é tamanha que a traseira começa a trepidar violentamente até conseguir a tração necessária. E nessas horas nem adianta olhar nos retrovisores porque eles trepidam junto com o carro todo."
*Você acha que o Lauda vai lhe dar algumas dicas de pista, durante a próxima temporada?
"De acerto de carro, tenho certeza de que vai conversar comigo. Só conversar. De técnica de pilotagem, nunca. Nunca vai pintar um papo do tipo "ali você faz assim, lá vem mais por dentro e etc." Nada disso. Cada um na sua..."
*E em matéria de grana. Vai ganhar legal?
"No ano que vem, só um percentual dos prêmios, mais nada."
*Vai dar para viver bem?
"Vai"
*E estas promoções, recepções, entrevistas coletivas, etc... organizadas pela Parmalat?
"Estão me dando a maior canseira. No Hilton , quando dei de cara com um monte de microfones e jornalistas, pensei até em voltar. Ma acho até um bom investimento."
*Em uma equipe menor não haveria estes problemas...?
"Mas também haveria menos chances de ser competitivo. Para 1979 recebi convites da Ensign, BS, ATS, Williams e Surtees. Acho a Brabham, facilmente, a melhor delas."
*O que você espera realmente do Piquet piloto no ano que vem?
"Muita calma para aprender e usar tudo no segundo ano. Não espero ser uma sensação. Dentro de um Brabham ou um Super-Vê, sinto a mesma coisa. A responsabilidade não me preocupa."