sábado, 29 de janeiro de 2011

Reutemann, sai de cena

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Carlos Alberto Reutemann já não corre mais. No palco de Long Beach, o tradicional capacete branco com faixas azul e amarelo, quase uma marca registrada da Formula 1 durante mais de uma década, foi uma ausência sentida.
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A decisão em abandonar, agora definitiva, aconteceu uma semana após a segunda prova da temporada, o Grande Prêmio do Brasil, depois que o vice-campeão mundial passou quase quatro meses amargurado, indeciso. Continuar ou não ? A saída de Alan Jones, aliada a um nada desprezível contrato que lhe garantia a almejada posição de primeiro piloto, foi o argumento final de Frank Williams para manter o fazendeiro milionário sob sua tutela.
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Mas a decepção da corrida decisiva da última temporada, em Las Vegas, marcou mais fundo que o próprio Reutemann poderia imaginar. Bastaram mais duas provas para que se conscientizasse de que a Formula 1 já não lhe proporcionava mais qualquer apelo emocional ou financeiro. Pior, já se transformara em uma obrigação, exaustiva e enfadonha.
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Carlos Reutemann já não corre mais e a delirante torcida argentina, sem dúvida a mais apaixonada do mundo (sim, porque os italianos são emocionais) perde com isso mais um pouco de seu interesse pelo automobilismo. Foi uma dura constatação, logo depois que a destrutiva política da Formula 1 tornou impossível a disputa do Grande Prêmio da Argentina. Nunca mais, provavelmente, o Autódromo Municipal de Buenos Aires vai estremecer como nas vezes em que Carlos Reutemann saía dos boxes para a volta de alinhamento. E, nunca mais, também, vai se ouvir o " Y Dale Lole " cantado em uníssono por milhares de pessoas.
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Reutemann, um veterano de muitas glórias e nenhum título, abandonou as pistas. Sem dúvida foi um grande piloto, um vencedor, ma não foi perfeito e nem pode ser nivelado a alguns outros que também não conseguiram qualquer título. Suas maiores potencialidades muita vezes acabaram eclipsadas por fatores negativos de sua própria personalidade, sempre a mais controvertida possível.
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Em sua passagem pelas escuderias Ferrari, Brabham, Lotus e Williams, Reutemann proporcionou grandes espetáculos, venceu no seu melhor estilo, mas também foi autor de inesquecíveis fiascos e em todas elas, sem restrição, acabou criando um clima de mal estar. Se Reutemann foi reputado um excelente acertador e uma tocada das mais refinadas, não deixou de marcar suas performances, normalmente cerebrais, por uma tremenda falta de verve, de garra, de vontade de vencer. Mas, da mesma maneira, dificilmente entregava uma corrida que se delineava à sua feição.
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Arredio à imprensa e insensível aos apelos de sua própria torcida, Reutemann, pelo menos na Argentina, investia-se da já antiquada imagem de mito intocável. Também, durante toda a sua controvertida carreira, foi perseguido sem tréguas por parte da imprensa de seu país que lutou obstinadamente por sua destruição moral. Jornais e revistas argentinos divulgaram com destaque sua prisão na Inglaterra quando furtara um par de luvas em um grande magazine, tentando impingir-lhe a pecha de cleptomaníaco. Mas o maior golpe deve ter sido o noticiário sobre um badalado romance de sua esposa, Mimicha, com Vittório Brambilla, também conhecido na Itália como o "Gorila de Monza".
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Carlos Reutemann parou de correr, mas sem dúvida não passou em branco. Fez história e sempre foi notícia, dentro e fora das pista. Se sua vida íntima foi tão devassada quando a profissional, esta é uma faceta inerente às grandes estrelas. E ele sempre foi, e adorou ser, uma grande estrela ...
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Se ao longo de sua carreira de 10 anos na Formula 1 a luta pela conquista de ao menos um título mundial revelou-se infrutífera, ainda assim o saldo final é positivo. Esse argentino de Santa Fé, nascido a 12 de abril de 1942, ao longo de 146 GPs marcou 12 vitórias e em seis oportunidades largou na pole position. Reutemann foi também um dos três únicos pilotos da hístoria da Formula 1, a conseguir a pole na prova de estréia (Argentina 1972) e detém um recorde de durante 15 vezes seguidas, entre 1980 e 1981, chegou entre os seis primeiros.
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A primeira participação de Lole no automobilismo remonta ao ano de 1965. Nessa época, com um Fiat, ele já demonstrava habilidade. Em 1967, estava entre os melhores pilotos do país, sendo selecionado para a série argentina de Formula 2, em 1968. Mesmo com um carro pouco competitivo, Reutemann não passou despercebido: financiado pela YPF, a estatal argentina do petróleo, foi à Europa em 1970 correr pela equipe de Carlos Ruesch, integrada por mecânicos de seu país. Os resultados não corresponderam, mas Reutemann não desistiu e terminou o Campeonato Europeu de 1971 em segundo lugar, logo atrás de Ronnie Peterson. Caiu nas boas graças de Bernie Ecclestone, que prontamente lhe ofereceu um contrato com a Brabham.
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Apesar da pole na estréia, os primeiros pontos só chegaram no final da temporada: 4º lugar no Canadá. Na Africa do Sul em 1974, enfim a primeira vitória, interrompendo desconfortável jejum que por quatro anos infernizava a vida da Brabham, desde 1970 sem sentir o gostinho do champagne. Foi o começo: depois, Austria e Estados Unidos.
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Em 1975, tinha como companheiro de equipe o brasileiro José Carlos Pace, com quem manteve relacionamento bastante atribulado. Vitória, só no Grande Prêmio da Alemanha. Já na Ferrari, em 1977, Reutemann venceu o Grande Prêmio do Brasil pela segunda vez (em 1972, na primeira vitória, a prova não era válida pelo Mundial), recuperando-se em parte da má campanha no ano anterior e visando um feito que repetiria em mais duas ocasiões, 1978 e 1981.
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Em 1978, a melhor fase da carreira: quatro vitórias. O título, contudo, ficou nas mãos de Mario Andretti. Em 1979, na Lotus, os segundos lugares na Argentina e Espanha foram os melhores resultados de uma temporada fraca.
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Em 1980, Lole assina com a Williams, onde permaneceu até o momento de abandonar. Ganhou o Grande Prêmio de Mônaco, mas iniciou a desavença com Alan Jones, companheiro de equipe, que só terminou com a desistência do australiano em continuar na Formula 1. Em 1981, esteve a um passo do sonhado título, mas a crise interna na Williams acabou facilitando tudo para Piquet, que levantou o campeonato em condições teoricamente favoráveis ao argentino.
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Carlos Reutemann, "Lole", ídolo maior de uma torcida apaixonada, deixa o automobilismo ...
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