sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

MAIS UMA ESTRELA QUE SOBE



1975 - Apenas dois anos e meio depois de estrear no automobilismo brasileiro, Ingo Ott Hoffmann, aos 22 anos de idade, está pronto para disputar a Formula 3. Com uma carreira rápida e uma ascensão técnica excelente, ele começou com um Volkswagen entre estreantes e novatos, em julho de 1972 e tornou-se um piloto de competição PC com apenas seis corridas disputadas.

Dos tempos de Fusca de rua, com os quais se iniciou na Divisão 1, até hoje, o nível de Ingo desenvolveu-se num ritmo tão alucinante que ele transformou-se em recordista com os carros da Magnun Kaimann da Formula Super Vê, no ano passado. E agora, de malas prontas, o jovem piloto brasileiro vai para a Inglaterra, onde, segundo ele, iniciará sua carreira profissional.

Com 27 corridas em sua agenda, além do Campeonato Inglês, Ingo estará correndo também nas preliminares dos Grandes Prêmios de F1 de Monaco, Paul Ricard e Nurburgring.

"Vou correr em tudo que puder, sempre dando preferência às corridas mais disputadas. Vou aprender e é onde estiverem os mais experientes que vou brigar. Prefiro um quinto ou um sexto lugar brigando com os cobras, a um segundo numa corrida fácil."

Mas essas decisões de Ingo tiveram em grande dose a influência dos Irmãos Fittipaldi. O entendimento do novo piloto, principalmente com Wilson Fittipaldi, começou logo depois de sua vitória nas 25 horas de Interlagos, em abril do ano passado. Nessa prova, o trio Wilson-Ingo-Reinaldo Campelo, com um Opala, conseguiu derrotar os Maverick, até ali imbatíveis. Embora fossem desclassificados por força do regulamento, Ingo ainda saiu ganhando, pois conquistou a admiração de Wilsinho, que passou a ser seu team manager na Super Vê, preparando seu carro e convidando-o para acompanhar todo o desenvolvimento do Fitti 01.

Foram também os irmãos Fittipaldi que o apresentaram ao inglês Clive Santos. Veterano piloto das Formulas 3 e 5000, Clive será seu chefe de equipe durante a sua primeira temporada. O carro será um March 375 e o motor será escolhido entre um Toyota, um Ford e um BMW. A BMW tem boas chances, pois criou um motor bastante competitivo para a Formula 3, como já havia feito para a Formula 2 no ano passado.

Mas pode ser qualquer um deles. O Alemão, como é conhecido entre os companheiros, se preocupa é com seus planos e sua disposição de enfrentar o novo desafio. Ele sempre levou a sério qualquer corrida de que participasse. Passou a piloto graduado por intimação da Federação, em sua primeira temporada na Divisão 3, onde começou com um Volkswagen, passando em 1973 para uma Brasília, mas deixando sua marca desde a primeira corrida.

Foi pole-position, ganhou a prova, repetiu o feito em Cascavel, ganhou todas as provas até chegar a Interlagos na final. Essa corrida que encerrava os Campeonatos Brasileiro e Paulista, marcou o coroamento definitivo de Ingo, um estreante na briga contra pilotos veteranos.

Ele largou em último lugar, mas precisava chegar pelo menos em sexto para ser campeão. Chegou em primeiro e ganhou os dois títulos. E no ano passado bisou: foi campeão Paulista e Brasileiro na Divisão 3 Classe A.

Consagrado no Turismo foi na Super Vê que Ingo obteve melhores resultados, apesar de não ser campeão (chegou em terceiro no campeonato). Foi o piloto que ganhou mais baterias, vencendo nove das dezoito disputadas nas seis corridas do calendário. E foi pole-position em todas as provas.

"Na Super Vê eu acabei aprendendo muito. Um carro competitivo, um monoposto ensina muito para quem quiser tentar a Formula 3. suas reações são quase as mesmas, embora os Formula 3 sejam mais rápidos no torque de curva e no final. Com o Super Vê pode-se sentir um comportamento aproximado dos carros da Formula 3". 

Claro que Ingo sabe que há mais competitividade nas corridas de Formula 3 na Europa: "Mas ficando aqui, competindo na Super Vê, eu teria no máximo cinco ou seis pilotos para brigar pela ponta. Lá eu serei um principiante, terei que disputar com mais gente e terei também mais chances de evoluir. Não vou para a F3 por vedetismo, mas em busca de aprendizado. Quero chegar à Formula 1 e não tenho tempo determinado para isso. Vou brigar, morar na oficina, observar, aprender. Acredito que o resto virá naturalmente."



A obstinação de Ingo tem entretanto fatos que a justificam: é aplicado, pratica métodos físicos e ioga, faz ginastica antes e depois das corridas, não fuma, não bebe e companha tudo que é feito em seus carros. Seus planos para a formação de equipe na F3 são baseados em: 1- segurança técnica, para garantir a presença em todas as provas. 2 - um bom patrocínio de cerca de 600.000 cruzeiros para ter o respaldo financeiro assegurando o sucesso durante toda a temporada.

Na parte técnica, Ingo tem o assessoramento e o prestígio de Emerson e Wilsinho, ex-pilotos de Formula 3 e profundos conhecedores do automobilismo europeu. São excelentes conselheiros, na opinião do Alemão. O equipamento da competição requer: um March 375 com peças e acessórios, três motores mais as partes componentes e um caminhão para transporte, com equipamentos de oficina, pneus, rodas e outras coisinhas. O pessoal será formado pelo piloto, o chefe de equipe Clive Santos, um mecânico e um auxiliar.

Mas se o equipamento técnico e pessoal é bom, Ingo sabe que a maior parte de tudo isso dependerá de seu preparo. por isso, em sua bagagem estão incluídos os métodos físicos de sua academia e as regras do teste de Cooper. Treinamento que já vem fazendo com Emerson Fittipaldi nas praias do Guarujá, fornecidos por Admildo Chirol.

"Um piloto tem necessidade de estar bem preparado fisicamente, tanto quanto qualquer outro atleta. A concentração total dentro do carro, para mim, só é possível estando bem."

Antes de ter conseguido o patrocínio, de um importante grupo financeiro paulista, Ingo já tinha resolvido ir para a Formula 3 por conta própria, com a ajuda do pai e o dinheiro que arrecadasse na venda de todos os seus carros: o Fusca da Divisão 1, o Brasília Divisão 3, a motocicleta, o carro Alfa Romeo de passeio e o Kaiman de Super Vê. Depois, mesmo com o patrocínio, acabou vendendo todos eles.

"Como felizmente consegui um bom patrocínio, posso guardar o dinheiro de meus carros e minhas economias para outra temporada, se não conseguir renovar o patrocínio. O fato é que não vou parar nessa. Aconteça o que acontecer, eu fico para 76. Sei que terei muita coisa para aprender e fazer. E, sinceramente, não acredito que com apenas uma temporada de Formula 3 eu esteja pronto para subir à Formula 2. Não vou com o pensamento de chegar lá e abafar. Claro que, no fim desse ano, já deverei tentar alguma corrida de Formula 2. Eu tenho certeza de que um ano lá vale por três temporadas aqui."

Hoje, Ingo tem o total apoio de seu pai. Dustin Hoffmann (que não tem nada a ver com o ator de cinema), e de sua mãe, dona Evelyn. Seu pai, aliás, é um de seus maiores incentivadores, sempre de cronômetro na mão e vibrando mais do que ninguém com os tempos de Ingo na temporada de Super Vê. Mas no começo. com medo dos riscos para o filho, era contra sua participação nas corridas de kart, quando o Alemão tinha apenas 17 anos. Também as primeiras corridas no automobilismo, como estreante e novato, foram feitas às escondidas. Mas depois Dustin Hoffmann,vendo que o filho não tinha apenas um entusiasmo passageiro pelas corridas e sim uma grande vocação, aprovou. E foi dos que mais batalharam para que conseguisse o patrocínio.

Ingo é um piloto com facilidade de adaptação a qualquer carro. Tem um físico ideal para a profissão, pois, com seus 1,73 m de altura e 60 quilos de peso, o cockpit do F3 parece sob medida para ele.

Falando perfeitamente o alemão, embora descendente apenas de quinta geração, dia 15 de março embarca para a Europa carregando seu sotaque ítalo-paulista, quando fala o português. mas leva também muita esperança e confiança.

Afinal, Ingo vai credenciado como a maior revelação do automobilismo brasileiro, depois de Emerson Fittipaldi e José Carlos Pace. E pretende fazer exatamente como eles: começando de baixo, de leve para chegar lá.